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19 de Abril de 2024

Prisão Cautelar e Prisão preventiva - Advogado Marcelo Fidalgo

A prisão-pena será oriunda de uma decisão transitada em julgado; já as prisões sem pena serão utilizadas como medidas cautelares para garantir que o processo seja eficaz quanto ao seu fim

Publicado por Marcelo Fidalgo Neves
há 8 anos

Prisão, segundo Nucci[1] (2005), é “a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere”. Tourinho Filho[2] a define como a “privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória”. A prisão, em nosso ordenamento, é aplicada de duas formas distintas: a prisão-pena e a prisão sem pena.

A prisão-pena será oriunda de uma decisão transitada em julgado; já as prisões sem pena serão utilizadas como medidas cautelares para garantir que o processo seja eficaz quanto ao seu fim, para preservar a ordem pública, a ordem econômica e para conveniência da instrução criminal. São exemplos de prisão sem pena a prisão civil, a prisão cautelar quando da expulsão e extradição, a prisão cautelar de natureza constitucional quando do estado de sítio e a prisão cautelar de natureza processual.

O Art , LXI, da Constituição Federal preceitua que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar”. A garantia da necessidade de uma decisão judicial é muito importante, principalmente ao analisamos nosso passado recente, quando na Ditadura Militar eram efetuadas diversas prisões arbitrárias. Porém, apenas a exigência de uma decisão judicial não é garantia suficiente contra prisões arbitrárias. Não basta que a prisão tenha sido baseada em ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária, essa fundamentação deverá estar baseada em preceitos legais. A prisão deverá ser utilizada como “última ratio”, apenas quando não existirem outras medidas igualmente eficazes de atingirem seu fim. A prisão processual, sem pena, deverá ser tomada com fundamentação estrita e baseada em fundamentos objetivos.

Para Tourinho, o “cárcere não tem função educativa; é simplesmente um castigo, e, como já se disse, esconder sua verdadeira e íntima essência sob outros rótulos é ridículo e vitoriano”. Porém, a prisão provisória não pode ser considerada um castigo, já que ainda não há condenação. Por isso, as prisões cautelares deverão ser utilizadas excepcionalmente e suas modalidades, que serão estudadas nesse capítulo, são restritivas, não podendo ser ampliadas.

2.1 Prisões cautelares

Existem seis tipos de prisão cautelar: prisão temporária, prisão em flagrante, prisão preventiva, prisão em decorrência de pronúncia, prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível e a condução coercitiva de réu, vítima, testemunha, perito ou de outra pessoa que se recuse, injustificadamente, a comparecer em juízo ou na polícia. As prisões cautelares respeitam o princípio da taxatividade, são apenas aquelas previstas em lei. Portanto, o juiz não possui um poder geral de cautela que o permite decretar medidas cautelares não previstas em lei, como ele possui no processo civil. Nessa tese estudaremos, apenas, a prisão temporária e a prisão preventiva.

2.2 Prisão Temporária

A finalidade da prisão temporária, regulada pela Lei 7960/89, é assegurar uma eficaz investigação policial. Sua finalidade é evitar que, em liberdade, o investigado por crimes de maior gravidade possa dificultar a colheita de elementos de informação durante a investigação policial[3].

A prisão temporária foi criada para substituir a antiga prisão por averiguação. Como a Constituição Federal estabeleceu que somente o Judiciário está autorizado a expedir mandato de prisão, a autoridade policial não poderia mais prender para fins de investigação. Com essa limitação, entendeu o legislador ser necessário a criação de um tipo de prisão com os mesmos fins, porém de competência do Judiciário.

A prisão temporária terá duração de 5 dias prorrogáveis por mais 5 dias em caso de “extrema e comprovada necessidade[4]. Em caso de crimes hediondos, o prazo será de 30 dias renováveis por mais 30[5]. A decretação da prisão temporária não poderá ser de ofício pelo juiz, como é na preventiva, devendo haver representação para tal da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público. No caso de representação da autoridade policial, o Ministério Público deverá ser ouvido.

Terminado o prazo de prisão, a menos que tenha sido decretada sua prisão preventiva, o preso deverá ser colocado imediatamente em liberdade pela própria autoridade policial, independentemente da expedição de alvará de soltura pelo juiz. A prisão preventiva posterior à prisão temporária deverá ter fundamentação própria já que os requisitos da provisória e temporária são diferentes; não pode o juiz, portanto, decretar a prisão preventiva se baseando unicamente nos fundamentos da prisão temporária. Nos casos em que a autoridade policial, após realizar determinada diligência, entender que a prisão temporária se tornou desnecessária, ela deverá representar ao juiz para que este revogue a prisão.

Há duas hipóteses que autorizam a prisão temporária: “quando imprescindível para as investigações do inquérito policial” (inciso I do artigo da Lei 7960/89) ou “quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade” (inciso II). Nos dois casos, deverá haver “fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: homicídio doloso, sequestro ou cárcere privado, roubo; extorsão, extorsão mediante sequestro, estupro, atentado violento ao pudor; rapto violento, epidemia com resultado de morte, envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte, quadrilha ou bando, genocídio, tráfico de drogas; crimes contra o sistema financeiro; qualquer crime hediondo” (inciso III).

Badaró dirá que necessariamente deverá estar presente o inciso I, conjugado com o II ou III. Então, deverá estar presente ou I e II ou I e III para que seja cabível a prisão temporária. Portanto, para Badaró, é essencial que a prisão seja “imprescindível para as investigações do inquérito policial” para que ela seja cabível e que, mesmo se existirem fundadas razões de autoria e o indiciado não tiver residência fixa, não será cabível prisão temporária. Neste caso, Badaró interpreta dessa maneira porque essa seria uma punição desproporcional já que um indigente seria alvo de prisão temporária mesmo que não fosse essencial para as investigações.

A imprescindibilidade da prisão deverá ser provada com fatos concretos que indiquem que a permanência do investigado em liberdade atrapalhará as investigações, seja por destruição de provas, ameaças a testemunhas ou outros motivos. A oitiva do investigado não justifica a prisão temporária; se o indiciado tem o direito de se manter calado, não há justificação de uma prisão para apenas ouvi-lo.

2.3 Liberdade provisória

A liberdade provisória é a medida intermediária entre a prisão preventiva e a liberdade completa. A liberdade não é total por dois motivos. Primeiro porque se o autor vier a ser punido com pena privativa de liberdade, sem sursis ou qualquer medida alternativa, a liberdade cessará e ele será recolhido à prisão; segundo porque, durante o tempo em que o réu ou indiciado estiver em liberdade provisória, essa liberdade não será completa[6]. Ela é chamada de provisória, pois é revogável. Caso o investigado ou réu não compareça a todos atos do processo, ele poderá ser preso novamente.

A liberdade provisória poderá ou não ser mediante fiança. Fiança é uma garantia real, podendo consistir em dinheiro ou em valores, para assegurar o direito de permanecer em liberdade. Ela busca assegurar o pagamento das custas, a satisfação do dano e eventual condenação de multa. Ao entregar valores seus ao Estado, o agente do delito está vinculado ao acompanhamento da instrução e está interessado em apresentar-se, em caso de condenação, para rever o valor que pagou. O réu ou indiciado tem que cumprir com as seguintes condições quando do pagamento da fiança: comparecer perante a autoridade todas as vezes que for intimado para atos do inquérito, da instrução criminal e para o julgamento; não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado[7].

Na atualidade, diminuiu muito a utilização da fiança devido a introdução do parágrafo único do artigo 310, que autorizou a liberdade provisória sem fiança.

2.4 Prisão Preventiva

A prisão preventiva é uma espécie do gênero prisão cautelar de natureza processual. É uma medida cautelar, restritiva de liberdade, determinada pelo Juiz em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal com diversos intuitos: para garantir eventual execução da pena: para preservar a ordem pública ou econômica; por conveniência da instrução criminal.[8]

A prisão preventiva é uma medida drástica, pois está sendo encarcerada uma pessoa que não foi condenada. Muitos autores, como Tourinho, afirmam que a prisão preventiva é uma injustiça necessária para o processo penal. Por ser uma injustiça, a prisão preventiva deverá ser reservada para casos excepcionais. Existem pressupostos claros para a sua decretação e a prisão não poderá ser decretada na ausência desses elementos. Tourinho identifica dois pressupostos para a sua decretação: prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. Já Nucci, identifica quatro pressupostos: natureza da infração; probabilidade da condenação; perigo na demora; controle jurisdicional prévio. (Nucci, 2005)

A prisão preventiva poderá ser decretada em qualquer fase da investigação criminal e do processo penal. Ela poderá ser decretada de ofício pelo Juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.[9] Deveria ser rara a decretação da prisão preventiva em fase de instrução criminal, pois a prisão temporária é a medida cautelar mais indicada para tais casos. Sobre o assunto, Badaró afirma[10]:

Tal sistemática poderia ser adequada no regime originário do CPP em que não existia a prisão temporária. Todavia, com o advento da Lei nº 7960/1989, que criou a prisão temporária, que somente é cabível durante o inquérito policial, e tem requisitos mais tênues que os da prisão preventiva, não tem mais sentido, diante de uma interpretação sistemática, a decretação da prisão preventiva no curso do inquérito policial. Aliás, se já há o fummus commissi delicti, isto é, indício de autoria e prova da materialidade delitiva, para a decretação da prisão preventiva (CPP, art. 312), também já haverá justa causa para ação penal. Em suma, ou, de um lado, é cabível a prisão preventiva e também já se têm elementos para o oferecimento da denúncia, e em tal contexto seria ilegal a continuação do inquérito policial sem denúncia oferecida, mormente estando preso o acusado ou, de outro lado, ainda não há elementos suficientes para a prisão preventiva, no que toca à ‘plausibilidade do direito de punir’, e também não se pode exigir o oferecimento da denúncia”.

Não existe prazo determinado para a duração da prisão preventiva, ela durará o prazo em que perdurar as causas para sua decretação ou até o trânsito em julgado da sentença condenatória, caso em que será convertida em prisão-pena. Apesar disso, esta não pode prolongar-se excessivamente por culpa do juiz ou por atos procrastinatórios do órgão acusador, o que seria constrangimento ilegal.

São três os requisitos para a decretação da prisão preventiva. Devem estar presentes dois pressupostos, a prova da existência do crime e o indício suficiente de autoria, juntos com uma das condições descritas no artigo 112 do CPP: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; garantia de aplicação da lei penal.

A prova da existência do crime é a certeza de que ocorreu determinada infração penal. Não pode uma pessoa ser presa se não houver certeza da ocorrência de um fato típico, o que violaria a presunção de inocência. Nesse caso, há um exceção ao regime das medidas cautelares, em que basta a probabilidade para a caracterização do fumus boni iuris; nesse caso, é necessário a certeza. Sobre o assunto, explica Badaró:

“(..) quanto à materialidade delitiva é necessário que haja prova, isto é, certeza de que o fato existiu. Se o juiz sequer tem convicção de que ocorreu um crime, não se pode admitir, sob pena de patente arbitrariedade, que seja determinada a prisão de alguém por um fato que nem se sabe se efetivamente existiu”[11].

O indício suficiente de autoria é a suspeita, baseada em indícios, de que o réu ou indiciado é o autor do crime; bastam indícios, pois exigir a prova plena de autoria inviabilizaria a utilização da prisão preventiva como medida cautelar. Por isso, basta uma suspeita fundamenta em indícios, a probabilidade da autoria.

Também deve ser analisado o periculum libertatis, o perigo em liberdade, que dará a urgência da prisão do acusado e a necessidade da medida cautelar. O juiz deverá fundamentar com fatos concretos o risco que a liberdade do acusado traz as instrução criminal ou a provável execução da pena. Conjecturas, temores infundados ou simples suspeitas não demonstram o periculum libertatis.

2.4.1Natureza da prisão preventiva: Tutela antecipada ou cautelar?

A tutela cautelar busca assegurar a utilidade e a eficácia de um provimento jurisdicional futuro, enquanto a tutela antecipada já antecipa, total ou parcialmente, os efeitos da tutela jurisdicional que será proferida no futuro.

Badaró irá defender que nosso ordenamento não aceita prisões preventivas com efeito de tutela antecipada, pois elas não respeitariam o princípio da presunção da inocência e seriam o equivalente a antecipação da pena.

“Diante de tais premissas, parece claro que somente serão compatíveis com o estado de inocência medidas cautelares propriamente ditas, isto é, prisões processuais que tenham natureza conservativa. De outro lado, não seria legítima qualquer prisão anterior ao trânsito em julgado da sentença condenatória que tenha por finalidade antecipar total ou parcialmente os efeitos da condenação penal e, portanto, seja mesmo que provisoriamente, satisfativa.”[12]( Badaró, 2008, p165)

2.4.2Condições para a prisão preventiva

2.4.2.1Ordem pública

Ordem Pública é um requisito legal amplo, conceito, de certa forma, vazio, que poderá enquadrar muitas situações, aumentando o alcance discricionário do juiz. Nucci diz que “a garantia da ordem pública é a hipótese de interpretação mais ampla e insegura na avaliação da necessidade da prisão preventiva[13]. A doutrina entende que ordem pública como a necessidade de se manter a ordem na sociedade que pode ter sido abalada pela ocorrência de um crime. Crimes graves, de forte repercussão, que causariam um forte sentimento de insegurança, de medo e de impunidade podem abalar a ordem pública e justificariam a prisão preventiva.

“A jurisprudência tem se valido das mais diversas situações reconduzíveis à garantia da ordem pública: ‘comoção social’, ‘periculosidade do réu’, ‘perversão do crime’, insensibilidade moral do acusado’, ‘credibilidade da justiça’, ‘clamor público’, ‘repercussão na mídia’, ‘preservação da integridade física do indiciado’... Tudo cabe na prisão para garantia da ordem pública.”[14]

Na prisão preventiva com o fundamento na defesa da ordem pública, não se prende para assegurar a necessidade de um futuro provimento condenatório ou para a conveniente instrução criminal. Nessa prisão, o que se busca é a antecipação de alguns efeitos da condenação penal, é forma de tutela antecipada que executa antecipadamente a pena, como medida de defesa social. A prisão embasada na defesa da ordem pública será utilizada, portanto, nos casos em que não se enquadram os requisitos para uma prisão cautelar, mas que ela será necessária para a defesa social.[15]

A prisão por questão de ordem pública é a utilizada quando se entende que o réu, investigado ou indiciado tem grande probabilidade de continuar com as ações criminosas se continuar em liberdade.

“Não há razão para ignorar os reflexos da prevenção especial da pena baseada na prisão preventiva do infrator como meio de impedi-lo de voltar a praticar crimes considerados gravíssimos pela legislação, já que a própria prisão em flagrante é utilizada como forma de evitar a produção de consequências posteriores ao crime, o que de certa forma equipara-se as exigências de defesa social. A necessidade de bloquear a atividade delitiva do flagrante delito é legitimada pelo princípio da presunção de inocência, da mesma forma que legitima a prisão preventiva decretada por razões de ordem pública.”[16]

Em geral, não é aceita a prisão preventiva baseada apenas na gravidade do delito, mesmo quando se tratar de crime hediondo. Assegurar a integridade física e a vida do acusado também não é fundamento para a prisão preventiva para a garantia da ordem pública; o acusado não pode pagar pela incompetência do Estado em preservar a integridade física de seus cidadãos. A prisão preventiva para a garantia da ordem pública também não poderá ocorrer muito tempo depois da prática delitiva. (Badaró, 2007)[17]

Renato Barão Varalda vai discordar dessa visão de Badaró, de que a gravidade do delito é irrelevante para a prisão preventiva. Para ele, a gravidade do delito é critério essencial para a caracterização do critério de ordem pública, e deverá ser analisado caso a caso.

“O magistrado deve orientar-se por critérios objetivos consubstanciados na análise da realidade social para incidir a ‘gravidade do ato’ e, por consequência, a ‘periculosidade do agente’, dentro das exigências de ordem pública. Por certo, não se trata de hipótese de prisão preventiva obrigatória, aplicada automaticamente ao acusado de um infração penal grave, com a dispensa de demonstração da medida. Pelo contrário, torna-se imperioso o exame da conveniência e oportunidade do decreto preventivo pelo magistrado às pessoas envolvidas com a prática de graves delitos.[18]

2.4.2.2Ordem econômica

Na garantia da ordem econômica busca-se impedir que o agente causador de delitos financeiros permaneça em liberdade, o que aumentaria a sensação de impunidade que a sociedade já possui a respeito desses crimes. Também se impede que o criminoso continue a praticar delitos que abalem a ordem econômica.

A prisão para garantia da ordem econômica tem sido identificada com situações de crimes que envolvam vultosos golpes no mercado financeiro, abalando a credibilidade na ordem econômica ou do sistema financeiro”(Badaró, 2007, p.145). Esta prisão para a garantia da ordem econômica não é uma medida de natureza cautelar já que sua finalidade é permitir uma execução antecipada da pena, visando aos fins de prevenção geral e especial, e não para assegurar os meios ou resultado do processo.

A lei nº 7492/1986 prevê outro fundamento para a previsão preventiva embasada na garantia da ordem econômica, a “magnitude da lesão causada”. Badaró dirá que esse critério é inconstitucional, por não ter natureza cautelar. “Aliás, se a magnitude da lesão causada ao bem penalmente tutelado guardasse natureza cautelar, certamente seria aplicável a qualquer delito. E, nesse caso, por exemplo, num crime de homicídio, a ‘magnitude a lesão causada’, isto é, a morte, sempre justificaria a prisão.” (Badaró, 2007, p.146).

2.4.2.3Conveniência da Instrução Criminal

Outro motivo de grande relevância para a prisão preventiva é a conveniência da instrução criminal. Muitas vezes o réu ou acusado ameaça ou suborna testemunhas, peritos, o órgão acusatório, à vítima ou o juiz; oculta ou destrói provas, ou não comparece aos atos de instrução processual em que sua presença seja necessária. Nesses casos, é necessária a decretação da prisão preventiva para conservar as provas e seus meios de produção para a efetiva instrução criminal e para que o processo atinja seu resultado.

Não é legítima a prisão preventiva quando o acusado se recusar a colaborar com a instrução criminal, pois a Constituição lhe garante o direito de não produzir provas contra si mesmo.[19]

2.4.2.4Assegurar a aplicação da lei penal

A prisão preventiva para a garantia da aplicação da lei penal visa garantir que o direito de punir se consolide. Quando houver indícios de fuga ou quando ela já tiver ocorrido, a prisão preventiva será necessária.

O perigo de fuga ocorre, por exemplo, quando o investigado ou acusado prepara-se para deixar o seu domicílio, desfaz-se dos bens imóveis, procura obter passaporte, compra passagem aérea para o exterior, ou de outra forma demonstra desejo de empreender viagem não justificada por outro motivo (p. Ex: lua-de-mel) ou revela a outrem o propósito de fuga”[20].

2.4.3Outros requisitos

É cabível prisão preventiva apenas para os crimes dolosos que sejam puníveis com pena máxima superior a quatro anos (artigo 113 do Código de Processo Penal). Essa norma é totalmente restritiva e descarta totalmente a prisão preventiva em casos de crimes culposos, já que esses agentes não tem periculosidade, assim como crimes dolosos com pena inferior a 4 anos. Porém, no caso dos crimes como pena inferior a 4 anos, como exceção, há a possibilidade da prisão preventiva nos casos em que o agente do delito tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado.

A lei nº 11340, visando combater a violência doméstica e familiar contra a mulher, acrescentou ao rol da prisão preventiva os casos em “o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”. Este dispositivo tem como intuito liberar a prisão preventiva para casos de crimes dolosos com pena inferior a 4 anos que envolvam violência doméstica, como lesões corporais leves, já que a prisão preventiva já era liberada para os crimes de violência domésticas com penas acima de 4 anos.

O parágrafo único do artigo 113 do CPP também admite a prisão preventiva para os casos de “dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.”

A prisão preventiva não será aplicada nos crimes em que estiver presente a exclusão de ilicitude, como estado de necessidade, legítima defesa, exercício regular de direito e estrito cumprimento do dever legal. Portanto, se o juiz julgar haver indícios que o crime foi praticado por conta de uma dessas exclusões de ilicitude, a prisão preventiva não poderá ser decretada. [21]As excludentes de culpabilidade, por analogia, também não podem ser alvo de prisão preventiva; são os casos da coação moral irresistível e do erro de proibição. Porém, não é o caso do inimputável, doente mental, cuja periculosidade pode justificar a prisão preventiva.

2.4.4 Proporcionalidade

O juiz ao analisar o pedido de prisão preventiva também deverá analisar a proporcionalidade entre a pena a ser aplicada ao final do processo e a prisão cautelar. Embora a prisão preventiva não seja uma pena antecipada, não há grandes diferenças entre os efeitos causados ao preso. Por isso, na prisão cautelar, o acusado não deve ser “castigado” de forma superior a que ele provavelmente será no caso de condenação. Por isso, para a decretação da prisão preventiva, não bastará ao juiz analisar apenas a prova da existência do crime e o indício suficiente de autoria, critérios para se analisar a probabilidade da condenação; o juiz deverá verificar a probabilidade de que tenha de executar um pena privativa de liberdade. Nos casos em que seja provável pens de multa, penas privativas de liberdade substituídas por restritivas de direito, pena privativa de liberdade condicionalmente suspensa, pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime aberto, seria desproporcional a prisão preventiva e o juiz não deverá acata-la.

“Na prisão preventiva, o acusado não deve pagar um preço que ele provavelmente não será chamado a pagar nem mesmo depois da condenação. (...) A proporcionalidade não deve ser buscada somente tendo em vista a pena cominada ao delito, mas considerando-se a pena que provavelmente será aplicada, ainda que com base em uma cognição sumária”[22].

2.4.5 Revogação da prisão preventiva

Quando deixar de existirem os motivos para sua decretação, o juiz deverá revoga-la[23]. Ocorre, por exemplo, quando o réu é preso preventivamente por estar ameaçando as testemunhas e prisão se torna desnecessária após a audiência em que elas foram ouvidas. (Badaró, 2007) A falta de proporcionalidade entre a pena provável em caso de condenação e a prisão preventiva também autoriza sua revogação assim como quando a prova colhida na instrução convence o juiz que o réu será absolvido.

Prisão relaxada é diferente de prisão revogada. Quando a prisão preventiva for ilegal, ela será relaxada[24]. A prisão preventiva será ilegal quando desrespeitar um de seus requisitos. Por exemplo, quando o acusado for preso preventivamente por crime culposo. Ela também poderá se tornar ilegal, no caso de excesso de prazo, e também deverá ser relaxada.

Também se deve diferenciar a revogação da prisão preventiva da concessão da liberdade provisória. A liberdade provisória só é cabível em face da prisão em flagrante delito, em face da prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível e em face da prisão para recorrer da decisão de pronúncia. A liberdade da prisão preventiva é sempre revogada.

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[1] NUCCI, GUILHERME DE SOUZA. Manual de processo e execução penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005

[2] TOURINHO FILHO, FERNANDO DA COSTA. Manual de Processo Penal. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

[3] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

[4] 2º A prisão temporária será decretada pelo Juiz, em face da representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público, e terá o prazo de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

[5] § 4o A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

[6] Art 310, 327, 328, 350 e 343 do CPP.

[7] Artigo 327, CPP

[8] TOURINHO FILHO, FERNANDO DA COSTA. Manual de Processo Penal. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

[9] Código de Processo Penal, Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial

[10] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

[11] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, p. 152.

[12] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Texto: A prisão preventiva e o princípio da proporcionalidade. Livro: Estudos Criminais em Homenagem a Weber Martins Batista. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2008, p.165.

[13] NUCCI, GUILHERME DE SOUZA. Manual de processo e execução penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005

[14] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. P.143.

[15] Idem.

[16] VARALDA, RENATO BARÃO. Restrição ao princípio da presunção de inocência: prisão preventiva e ordem pública. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2007. P.161

[17] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007

[18] VARALDA, RENATO BARÃO. Restrição ao princípio da presunção de inocência: prisão preventiva e ordem pública. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2007 P. 167

Constituição Federal, Artigo , LXIII – “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”;

[20] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Direito processual penal: tomo II. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

Código de Processo Penal, Art. 314. “A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal”.

[22] BADARÓ, GUSTAVO HENRIQUE RIGHI IVAHY. Texto: A prisão preventiva e o princípio da proporcionalidade. Livro: Estudos Criminais em Homenagem a Weber Martins Batista. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2008. P.174

[23] Código de Processo Penal, Art. 316. “O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”

[24] CF, art. , LXV “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”

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